Reforço do combate<br>à toxicodependência<br> é uma prioridade

Paula Santos

No dia 26 de Junho as­si­nalou-se o Dia In­ter­na­ci­onal contra o Abuso e o Trá­fico Ilí­cito de Drogas, pro­cla­mado pelas Na­ções Unidas em 1987.

No nosso País, o com­bate à to­xi­co­de­pen­dência co­nheceu re­sul­tados sig­ni­fi­ca­ti­va­mente po­si­tivos, na sequência da de­fi­nição da nova es­tra­tégia po­lí­tica, para a qual o PCP deu um enorme con­tri­buto. Es­tra­tégia po­lí­tica que as­senta na acção con­ju­gada de três ele­mentos: apro­vação da co­nhe­cida lei da des­pe­na­li­zação do con­sumo de drogas, que passou a ver o to­xi­co­de­pen­dente como um do­ente e não como um cri­mi­noso (trans­fe­rindo a in­ter­venção no âm­bito da Jus­tiça para a saúde); cri­ação das Co­mis­sões de Dis­su­asão para a To­xi­co­de­pen­dência; e a adopção de uma visão in­te­grada das va­lên­cias de in­ter­venção (dis­su­asão, pre­venção, re­dução de riscos e mi­ni­mi­zação de danos, tra­ta­mento e rein­serção). Ao fim de uma dé­cada de im­ple­men­tação re­gistou-se a re­dução do con­sumo entre os mais jo­vens, a re­dução dos con­sumos pro­ble­má­ticos, em es­pe­cial o con­sumo en­do­ve­noso e a re­dução da in­ci­dência do VIH/​SIDA nos to­xi­co­de­pen­dentes.

No en­tanto, desde que este Go­verno ini­ciou fun­ções, traçou como ob­jec­tivo o des­man­te­la­mento da po­lí­tica de com­bate à to­xi­co­de­pen­dência. A ex­tinção do Ins­ti­tuto da Droga e To­xi­co­de­pen­dência (IDT) e a sub­se­quente de­sar­ti­cu­lação das va­lên­cias de in­ter­venção através da cri­ação do Ser­viço de In­ter­venção para os Com­por­ta­mentos Adi­tivos e De­pen­dên­cias (SICAD) com fun­ções ex­clu­si­va­mente de de­fi­nição das ori­en­ta­ções ge­rais e da trans­fe­rência de toda a com­po­nente ope­ra­ci­onal para as Ad­mi­nis­tra­ções Re­gi­o­nais de Saúde, traduz bem essa opção.

Ao des­truir o IDT e se­parar as va­lên­cias de in­ter­venção o Go­verno que­brou a abor­dagem in­te­grada, a co­e­rência e a visão global sub­ja­cente ao rumo tri­lhado até então. O Go­verno impôs essa de­cisão num mo­mento em que a es­tra­tégia por­tu­guesa de com­bate à to­xi­co­de­pen­dência se tornou num caso de es­tudo a nível mun­dial, mo­ti­vando o in­te­resse de po­lí­ticos, es­pe­ci­a­listas e aca­dé­micos. A de­cisão foi to­mada sem qual­quer fun­da­mento téc­nico ou ci­en­tí­fico, o que gerou uma enorme des­mo­ti­vação e in­cer­teza junto dos pro­fis­si­o­nais.

Mas o des­man­te­la­mento da es­tra­tégia de com­bate à to­xi­co­de­pen­dência também se ma­te­ri­a­lizou no de­sa­de­quado fi­nan­ci­a­mento, o que teve ex­pressão na re­dução das equipas de rua, na re­dução e na des­va­lo­ri­zação pro­fis­si­onal e so­cial dos pro­fis­si­o­nais, na re­dução da ca­pa­ci­dade de res­posta dos equi­pa­mentos pú­blicos, no fim do pro­grama de troca de se­ringas nas far­má­cias (tem­po­ra­ri­a­mente), na re­dução do tra­ta­mento nas co­mu­ni­dades te­ra­pêu­ticas e nas cres­centes di­fi­cul­dades dos utentes no acesso à saúde.

Re­tomar o ca­minho in­ter­rom­pido

O Go­verno só não foi mais longe de­vido à re­sis­tência dos pro­fis­si­o­nais das es­tru­turas pú­blicas da área da to­xi­co­de­pen­dência. Mais, foi a in­ter­venção dos pro­fis­si­o­nais que ga­rantiu a uni­dade e a ma­nu­tenção das equipas (em­bora se en­con­trem ex­tre­ma­mente de­pau­pe­radas). Mas a ofen­siva não ficou por aqui e os riscos per­sistem, em es­pe­cial com a even­tual in­te­gração das uni­dades de de­sa­bi­tu­ação e das uni­dades de al­co­o­logia nos hos­pi­tais, como já foi al­vi­trado pelo Go­verno pros­se­guindo o pro­cesso de pul­ve­ri­zação das es­tru­turas pú­blicas na área da to­xi­co­de­pen­dência.

Im­porta, assim, su­bli­nhar a acção, a in­ter­venção, a re­si­li­ência e a de­fesa da es­tra­tégia po­lí­tica de com­bate à to­xi­co­de­pen­dência de­sen­vol­vidas pelos pro­fis­si­o­nais.

O con­texto eco­nó­mico e so­cial do povo e do País, com o ele­vado de­sem­prego, os baixos sa­lá­rios, o au­mento da po­breza, das de­si­gual­dades e da ex­clusão so­cial, exige não o de­sin­ves­ti­mento pú­blico como foi a opção deste Go­verno, mas sim o re­forço do in­ves­ti­mento no sen­tido do alar­ga­mento das res­postas pú­blicas.

A manter-se esta po­lí­tica, há o sério risco de um re­cru­des­ci­mento do fe­nó­meno da to­xi­co­de­pen­dência no nosso País. O ele­vado nú­mero de re­caídas, em es­pe­cial no con­sumo de he­roína, é já um in­dício que nos deve pre­o­cupar.

Não foi com esta po­lí­tica que foi pos­sível que a to­xi­co­de­pen­dência dei­xasse de ser uma das prin­ci­pais pre­o­cu­pa­ções das pes­soas no nosso País.

No plano na­ci­onal é ur­gente re­tomar o ca­minho in­ter­rom­pido, que já com­provou ser a opção cor­recta.

O re­forço da po­lí­tica de com­bate à to­xi­co­de­pen­dência é parte in­te­grante do pro­jecto po­lí­tico que o PCP cor­po­riza e que não é com­pa­tível com a po­lí­tica de di­reita de PS, PSD e CDS. Só uma po­lí­tica al­ter­na­tiva, pa­trió­tica e de es­querda como a que o PCP propõe aos tra­ba­lha­dores, ao povo e ao País, pos­si­bi­lita a con­cre­ti­zação de uma po­lí­tica de com­bate à to­xi­co­de­pen­dência que a re­a­li­dade exige.

Por isso, face à si­tu­ação do nosso País as pri­o­ri­dades passam pela re­cu­pe­ração da es­tra­tégia in­te­grada das va­lên­cias de in­ter­venção, pelo re­forço do in­ves­ti­mento pú­blico e o alar­ga­mento da ca­pa­ci­dade de res­posta da rede pú­blica de pro­xi­mi­dade, do­tando-a dos meios hu­manos e téc­nicos, assim como o re­forço das equipas de rua e na aposta na pre­venção.

No plano in­ter­na­ci­onal, em 2016 terá lugar a Sessão Es­pe­cial da As­sem­bleia Geral das Na­ções Unidas sobre a si­tu­ação mun­dial das drogas que será, cer­ta­mente um mo­mento im­por­tante na área da to­xi­co­de­pen­dência que im­porta acom­pa­nhar.




Mais artigos de: Argumentos

Carta das Nações Unidas<br>assinada há 70 anos

A26 de Junho de 1945 foi assinada, na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos da América, a Carta das Nações Unidas, que entraria em vigor quatro meses mais tarde. Nela se definiam os objectivos e forma de funcionamento da Organização das Nações Unidas, à...

Os dias da Grécia

Falando de televisão, e da televisão portuguesa que nestas colunas é o tema natural, bem se pode dizer que os dias da passada semana podiam ter sido nela os dias de um grande clube de futebol, e não só, cujas entranhas foram sacudidos por espasmos de natureza e intensidade...